Drogas, moradores de rua e humanidade



Sair das drogas requer muito mais que cuidados médicos. Requer uma infraestrutura ao redor que suporte o significado de uma vida sem drogas. Alias mais que isso, uma rede de significados e valores.
Se eu estivesse falando de uma estrutura material somente, não seria justificada a dificuldade de tantas pessoas das classes A e B que hoje estão afundados nas drogas. Tive a oportunidade de conhecer famílias dessas classes cujos valores se baseavam no dinheiro ou no intelecto.
“Você é importante para mim, veja o tanto que eu invisto em você!”;
“Você tem que estudar para ser alguém na vida!”
 Por acaso quem não estudou não é alguém? E como fica quem estudou, se formou, mas não se identifica com os estudos? Não se identifica com “ser alguém”?
Os valores modernos baseados no ter e no ser distanciaram o ser humano de sua humanidade, e mais ainda das questões básicas de sua existência. Dai as mediações humanas ganharam caráter superficial e temporário.
Quando alguém, morador de uma favela passa do lado de uma Ferrari, não se sente digno de ter uma conversa de igual com seu proprietário. Nem mesmo muitas vezes de entrar e fazer uso de um serviço público que lhe é de direito.
Quando falamos de morador de rua então, é mais notável ainda nas falas de seus interlocutores a crença de que realmente eles não são dignos, não são capazes de pensar e decidir por si. São vistos com desconfiança, descrédito e quando não, como idiotas. E o pior de tudo isso é que muitas vezes são obrigados a se sujeitar a esse papel para receber algum benefício e com o tempo eles passam a acreditar nessa crença.
Certa vez vi um grupo de moradores de rua, tendo que se sujeitar a condição de “possuídos pelo demônio” para receberem marmitex e roupas de um grupo de “voluntários” e “altruístas” nas noites de Campinas.
Ora, ganhavam a marmitex e perdiam a dignidade.
Um rapaz outro dia, vendo um casal de moradores de rua, em um canto sob um viaduto transando disse: que pouca vergonha fazendo “aquilo” em via pública! Devia ir trabalhar...
         Outra vez ainda, porque chegou reinvidicando seus direitos em um serviço público, e falando com propriedade, foi tido como arrogante, e “sem noção”.
Daí para poder receber atendimento, comida, roupas etc. teria que baixar a cabeça, não ter opinião nem religião e aceitar que não é ninguém.
Não sendo ninguém como pode ele então ser protagonista de sua própria vida? Como pode se realizar sem ser por uma fuga compulsiva pelas drogas. Como pode tirar prazer dessa situação, se nem mesmo uma relação afetiva pode ter?
Se ele tem dinheiro, como pode acreditar que esse pode ser investido em outras coisas que não naquilo que lhe dá prazer imediato?
Assim, não sendo humanos, porque não os consideramos assim como queremos que eles se comportem como tal?

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